Conselho Nacional dos Refugiados concede asilo político a nigerianos

 

A assessoria especial de apoio jurídico da Casa Latino-Americana tomou conhecimento esta semana que o Conselho Nacional dos Refugiados (Conare) concedeu asilo político a três, dos nove nigerianos que embarcaram clandestinamente no navio de bandeira turca “Yasa Kaptan Erbi”, na Região de Lagos, Nigéria, em setembro de 2011. Os jovens afirmam ter fugido por conta da perseguição político-religiosa que sofriam em seu país. Ao embarcarem no navio, acreditavam estar indo rumo ao continente europeu, porém, acabaram chegando ao Porto de Paranaguá, litoral do Estado do Paraná.

Depois de uma série de violações de direitos humanos sofridos e de oito meses de espera, os três jovens estão legais no país, sob a condição de refugiados. Uma indústria de fabricação de tapetes no Município de Almirante Tamandaré, Região Metropolitana de Curitiba-PR, concedeu moradia e empregou aos três.

Entenda o caso

Em setembro de 2011 movimentos sociais e entidades públicas do Paraná, dentre as quais a Casla – Casa Latino-Americana, receberam uma denúncia anônima alertando que nove migrantes nigerianos eram mantidos presos no navio de bandeira turca “Yasa Kaptan Erbi”, próximo ao Porto de Paranaguá, onde atracaria para ser carregado de soja.

Segundo relatos, antes de chegar ao Brasil, o navio fez uma escala na Nigéria. Neste momento, os migrantes embarcaram clandestinamente por um vão no eixo da embarcação e se esconderam na casa de máquinas. Inicialmente eram 10 rapazes, mas um deles morreu ao se acidentar e cair no mar. Segundo eles, decidiram fugir por conta da perseguição político-religiosa que sofriam na Nigéria. Os rapazes são cristãos e o país é de maioria muçulmana.

Depois de nove dias de viagem, alimentando-se apenas com as provisões que traziam, os migrantes resolveram se apresentar ao comandante para pedir água e comida. Imediatamente, o comandante comunicou a Polícia Federal de Paranaguá, que, por sua vez, impediu que o navio atracasse no Porto e permanecesse entre as Ilhas do Mel e Ilha das Cobras. O motivo apontado pelo delegado da Polícia Federal foi a possibilidade dos migrantes terem algum tipo de doença contagiosa.

A partir da decisão, o comandante do navio ordenou que os nigerianos fossem presos dentro de contêineres, ventilados apenas por uma escotilha. Os nove rapazes ficaram trancados durante 15 dias, e, pela falta de sanitários, faziam suas necessidades em garrafas d’água e baldes. Apenas depois da denúncia e por pressão dos trabalhadores portuários, começaram a ser alimentados três vezes ao dia.

Assim que tomou conhecimento da denúncia, a Casa Latino-Americana disponibilizou sua assessoria jurídica para encaminhar a resolução do caso e se dirigiu com outros movimentos sociais a Paranaguá. Com o auxílio de um interprete da língua yorubá, realizaram uma verificação em loco da situação em que os nigerianos se encontravam. As advogadas Ivete Caribé da Rocha e Nádia Floriani levaram o caso ao advogado Dr. Dálio Zipin Filho da Comissão de Direitos humanos da OAB-PR, que entrou com um pedido de habeas corpus para que os nigerianos pudessem desembarcar na cidade.  A Justiça Federal de Paranaguá concedeu o pedido e os nove rapazes foram levados há um hotel da cidade, onde ficaram hospedados durante cerca de um mês.

Depois deste encaminhamento, as advogadas orientaram o pedido de refúgio junto ao Conare – Conselho Nacional dos Refugiados para os três rapazes que optaram em permanecer no Brasil. O pedido de refúgio foi dado e agora estão legais no país, sob a condição de refugiados, podendo ficar o tempo que desejarem. Os nigerianos já estão trabalhando em uma indústria de fabricação de tapetes em Almirante Tamandaré, que também concedeu moradia aos três.

Análise

Apesar da resolução do caso, a advogada Dra. Ivete Caribé da Rocha faz uma crítica às políticas de migração no país. “O Estado é omisso quanto à estrutura política de migração. Não existe nenhum programa de inserção social para refugiados e migrantes. Não tem quem ensine a língua, dê apoio psicológico, moradia, emprego para essas pessoas.”, diz Ivete.

A assessora jurídica da Casla Dra. Nádia Floriani argumenta que parte do problema é decorrente do Estatuto do Estrangeiro, LEI Nº 6.964, de 1980. “Quando foi criado o Brasil vivia a época da ditadura militar, por isso, ele tem escopo da doutrina de segurança nacional e não um viés voltado para direitos humanos. Nós temos um projeto de lei (Projeto de Lei 5655 - Lei do Estrangeiro) engavetado desde 2005, que não trás alterações significativas para o Estatuto e que continuará impossibilitando o trabalho dos advogados na defesa dos direitos dos migrantes.”, afirma.

Além disso, a advogada explica que fatores socioeconômicos colaboram para a falta de interesse da sociedade e do Estado em repensar e efetivar as políticas de migração. “É nítida a diferença de tratamento entre o migrante socialmente vulnerável e um migrante com alto poder aquisitivo. Este último consegue visto e outros benefícios de forma mais célere. O Governo não se interessa pela questão do migrante porque não é interessante economicamente. O que ocorre é um cinismo social, uma ambiguidade da sociedade. Por um lado, o migrante irregular é perseguido pela polícia migratória, que está obrigada a aplicar as normas referentes à legislação. E, por outro lado, este mesmo migrante é tido como mão de obra barata”, esclarece.  

 Texto e imagem: Vinícius Gallon



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