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Um dos principais elementos motivadores para a
criação da Rede Internacional: Diálogo
de Saberes e Práticas Socioambientais e que está na origem de
múltiplas e diversas iniciativas desse gênero, que vem ocorrendo em escala
planetária, é a crescente convicção de que o modelo hegemônico de produção,
consumo e apropriação da natureza está na base dos incessantes desequilíbrios ambientais que
assolam exponencialmente o Planeta, desde o início da Revolução Industrial.
Esse modelo se expandiu em escala mundial, impondo conhecimentos, lógicas,
ideologias, práticas e modelos produtivos baseados na racionalidade
instrumental.
Essa racionalidade é composta de inúmeras
características, intimamente articuladas, embora hierarquizadas pela
sobreposição da ordem econômica sobre as demais, e pela relação meios e fins
práticos que conduzem as intenções contidas nas ações humanas e institucionais
das sociedades de mercado. Essa racionalidade orienta a conduta, os interesses,
os desejos e as intenções contidas nos sistemas de pensamento, dos valores, das
práticas e das técnicas legitimadas pelos sistemas políticos, éticos, estéticos
e dos estilos de vida próprios da modernidade capitalista, estatista, enfim,
regida pela lógica produtivista de mercado.
É próprio da modernidade, conforme nos alertam Weber
e Habermas, os sistemas institucionais funcionarem com relativa autonomia sustentando
a organização das sociedades pragmáticas e desencantadas, de tal maneira que as
diferentes racionalidades contidas em cada um dos subsistemas não se obriguem a
conexões com os demais: os sistemas técnicos, econômicos, políticos, jurídicos,
educacionais, de saúde, militar, midiático, sindicais, etc. assumem para si os
desafios que lhes são supostamente atribuídos, fechando-se em circuitos
próprios, com pouco controle externo e resistentes às críticas que porventura
lhes sejam endereçadas pelo sistema social.
Assim ocorrem com os sistemas de conhecimento
(científicos e não científicos) e com os sistemas técnicos (altamente
desenvolvidos ou artesanais) que organizam as práticas produtivas (econômicas)
que buscam responder mais às exigências de controle e de interesses ditados
pelas organizações estatais ou institucionais das sociedades (em diversas
escalas, já que estamos tratando de organizações e de sistemas
internacionalizados).
Por essas razões, e atendendo a diagnósticos que
desde outros lugares, diferentes dos hegemônicos, percebem a necessidade de
entender, processar e interpretar sob outra ótica, o funcionamento e os limites dessa
racionalidade hegemônica, é que os proponentes da Rede Internacional de
Diálogos de Saberes e Práticas Socioambientais buscam encaminhar diferentemente
desse sistema inercial, ações alternativas, baseadas em diálogos que respeitem
a diversidade e as diferenças, mas também instituir o que está separado,
restituindo aos sistemas de conhecimento, de valores e de práticas sua
vitalidade e seu compromisso com o que está em perigo, pela cegueira das
ideologias, pela desvalorização ao que resiste à contabilidade e à
“precificação” do mercado, e pela surdez arrogante da crítica que emerge de sua
própria irracionalidade.
Esses diferentes e diversos atores
(institucionais/representantes) pretendem juntar teoria e prática que se
distanciaram, se cristalizaram e se enrijeceram separadamente. Frente a um
sistema institucional (escolar, universitário) que somente reproduz o conhecimento,
prisioneiro de sua própria reprodução; instituições de ensino superadas pela
mídia, em termos de geração de informação, mas para as quais faz falta o
exercício reflexivo e crítico de entendimento e das conseqüências das informações
veiculadas para a formação de cidadãos.
Dessa forma, juntar teoria e prática social revela
que o conhecimento é também uma produção social e que as agências de
conhecimento (escolas, universidades, laboratórios, igrejas, mídia, etc.) são
uma parte desse processo mais abrangente e global, pois não se pode abstrair a
maneira de como as sociedades percebem, internalizam e devolvem ao próprio
sistema de conhecimento, a crítica e a criatividade de suas reinterpretações. Isso
implica, então, uma reflexão sobre o que é ‘conhecimento’ e como ele é
produzido. Por outro lado, também, o sistema de práticas desconhece a
importância do conhecimento, substituindo-o por algumas regras, procedimentos e
habilidades.
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